terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Dos lampiões à eletricidade em Porto Alegre

Reproduzo aqui para vocês ,em primeira mão, a minha matéria que sai na edição de março na revista do CREA-RS.

Muitas pessoas que passam no Centro de Porto Alegre talvez nem saibam que , nos idos do século 19, a iluminação era feita por lampiões. E que , em alguma residências, isso era sinônimo de "status" , apesar da fuligem e da fedentina que esses pontos primitivos de luz exalavam na cidade.

No ano de 1830 havia uma preocupação em iluminar a Rua da Praia e outras vias importantes de da capital gaúcha. Assim, foram comprados, no Rio de Janeiro, 250 lampiões a óleo de baleia. Foram chumbados nas paredes das casas para espalharem uma luz pálida de um fumarento pavio. Os lampiões só podiam ser acesos ao anoitecer e por um encarregado da Câmara. Mas somente em dezembro de 1832 por solicitação dos cidadãos de Porto Alegre, a Presidência da Província manda estabelecer orçamento para a instalação e manutenção da iluminação pública. O óleo de baleia continuou a ser usado, mas a forma do lampião mudou, sendo que não há registros sobre a data do início da sua utilização. Na busca de melhor luminosidade, os postes tiveram sua altura aumentada. Esta e outras informações sobre a história da iluminação em Porto Alegre podem ser conferidas na exposição sensorial de percurso Viagem ao Centro da Luz, sediada no Centro Cultural CEEE Erico Verissimo - CCCEV (veja abaixo dados adicionais sobre a exposição).

Segundo o historiador e doutor em História Social pela Universidade de São Paulo, Gunter Axt, em 1854, o óleo de peixe, ou de baleia, foi substituído por um sistema que queimava um tipo de gás hidrogênio, obtido a partir da água ardente. “Adaptaram-se combustores de folha de flandres aos lampiões. As coisas melhoraram com a introdução do querosene, em 1864”, completa.


Luminária a óleo de baleia da década de 1830. Fonte: Mergs.


A chegada da Iluminação elétrica em Porto Alegre

De acordo com o historiador, um banquete em homenagem ao poderoso Senador liberal Gaspar Silveira Martins, realizado no salão do Clube Comercial no dia 12 de novembro de 1887 está na história dos porto-alegrenses pela inauguração festiva do serviço de iluminação elétrica. Porto Alegre foi a primeira capital brasileira a dispor de um serviço regular de fornecimento de energia elétrica.

Conforme a historiadora e funcionária do Museu de Eletricidade do Rio Grande do Sul (MERGS) Mariana Froner Bicca, em 1874 é inaugurada a Usina do Gasômetro, por força de um contrato assinado entre o Presidente da Província e a Companhia de Gaz São Pedro Brazil Limited. O local destinava-se a produção de gás para iluminação pública que abrangia o centro da cidade. Os arrabaldes continuaram a ser iluminados com lampiões a querosene. De acordo com a historiadora, no ano de 1887 instala-se em Porto Alegre a Companhia Fiat Lux, dedicada a exploração da eletricidade, que devido a sua pequena capacidade geradora – uma usina termelétrica de 160KW- kilowatts, seu uso se restringiu ao âmbito particular (casas comerciais e particulares). A empresa trabalhava com algumas peculiaridades. "O consumidor era chamado de assinante e lhe era fornecido todo o material, inclusive as lâmpadas. O fornecimento iniciava-se ao anoitecer e mantido até às 22h no inverno e à meia-noite, no verão"\, esclarece a historiadora.

De acordo com Gunter Axt, a partir de 31 de dezembro de 1906, os consumidores passaram a usufruir do fornecimento de luz por toda noite e os contadores foram instalados nos imóveis dos clientes em 1º de abril de 1908 . Ele explica que até então, cobrava-se de todos os usuários um preço fixo. Em 1908 inaugurou-se a Usina Municipal de Porto Alegre, uma iniciativa da prefeitura que era responsável pela iluminação pública, dando inicio a substituição do gás e do querosene pela energia elétrica. Entretanto, a iluminação no Centro da capital continuava a gás e nos arrabaldes, nos bairros, era a querosene. O surgimento de uma nova tecnologia de iluminação não acarretava no descarte das anteriores, logo a iluminação era de três formas: a gás, querosene e elétrica, afirma o historiador.

Em 1929 inaugura-se o primeiro luminoso elétrico publicitário da cidade de Porto Alegre, com a inscrição Força e Luz, o qual fora destaque na edição de 2 de maio daquele ano, do jornal A Federação. “O annuncio luminoso “Força e Luz”, inaugurado antehontem, é constituído por 969 lampadas de cores branco, verde e encarnado, as quaes accendem e apagam continuamente, pelo systema corrido. Foi elle confeccionado no Rio de Janeiro, pela firma Burren & Cia., com material exclusivamente nacional, inclusive as lampadas, que são da fabrica Edison Mazda”, conforme trecho da notícia veiculada à época”, (na exposição Viagem ao Centro da Luz há uma réplica do luminoso em questão, veja abaixo).

O prédio Força e Luz, que atualmente abriga o CCCEV e o MERGS, foi construído entre os anos de 1927 e 1929 pelo Engenheiro Adolfo Stern e recebeu a inscrição Força e Luz na fachada, em 1929. Nesse mesmo ano o prédio passou a abrigar a Companhia de Energia Elétrica Riograndense (CEERG), empresa de capital estadunidense, que recebeu a concessão dos serviços de energia elétrica na capital gaúcha. Na vitrine do prédio, eletrodomésticos eram expostos para estimular o consumo, principalmente entre as donas de casa. A CEERG estava ligada a Companhia Brasileira de Força Elétrica, instalada no Rio de Janeiro e pertencente à American & Foreign Power Co. (Amforp), do grupo da Eletric Bond & Share Corp. Da década de 70 até o ano de 1998, o prédio operava como agência de pagamentos de contas de luz e abrigava serviços administrativos da empresa, tendo retomado seu funcionamento após a reciclagem do edifício, em 2002.


Imagem original da antiga vitrine da CEERG Fonte: Mergs.

Segundo o Eng. Eletricista e professor e doutor pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), Luiz Tiarajú dos Reis Loureiro, em 1943, a Comissão Estadual de Energia Elétrica (CEEE) foi criada para estudar novos aproveitamentos energéticos. A conversão de frequência de 50 para 60 Hz, ocorrida na década de 70, possibilitou a interligação do RS com o restante do país e o aproveitamento do regime de chuvas complementar entre as regiões Sul e sudeste. Conforme o professor, o desenvolvimento da indústria da energia elétrica no RS possibilitou maior qualidade para a população. “A energia elétrica contribuiu para o aumento da qualidade de vida, a fixação de agropecuaristas no campo e para surgimento de diversos ramos de indústrias de transformação no Estado”, explica.

Curiosidades
  • Acender os lampiões nas ruas era um trabalho tão demorado que, conta-se que, quando o encarregado terminava de acender o último lampião, já iniciava o desligamento dos primeiros, pois o dia já amanhecia.

  • O horário de verão passou a ser adotado após o racionamento de energia elétrica que ocorreu em 1986.
  • O racionamento de energia de 1968 foi realizado com cortes no fornecimento que deixavam extensas regiões do Estado no escuro.

  • Em 1937, foi colocada a chaminé na Usina do Gasômetro, depois de reclamações da população contra a fuligem e cinzas lançadas pela Usina. Em 1974 ela foi desativada e em 1983 o prédio foi tombado pelo patrimônio histórico.

  • No Calçadão da Rua da Praia, em 1970, foram instaladas várias luminárias decorativas. Elas foram o reflexo da “onda de modernidade” que tomou conta do Brasil naquela época. Hoje, podemos ver que a iluminação é feita por postes de 10 metros e lâmpadas a mercúrio ou sódio, bem diferente do que era antigamente.

Exposição no CCCEV

A exposição sensorial de percurso Viagem ao Centro da Luz, é realizada pelo Centro Cultural CEEE Erico Verissimo (CCCEV) e Museu de Eletricidade do Rio Grande do Sul (MERGS) e tem patrocínio do Grupo CEEE. Mostra a história da iluminação e outras curiosidades do bairro mais antigo de POA, o Centro Histórico, tais como a primeira sala de cinema com programação fixa da cidade, o Cine Recreio Ideal, de propriedade do advogado Francisco Damasceno Ferreira (1875-1953), o saudoso Clube dos Caçadores, a Companhia de Energia Elétrica Riograndense e o Mercado Público.

Com duração de 30 minutos, cada itinerário monitorado ocorre em intervalos de 45 minutos e comporta um grupo de até 12 visitantes. O público excedente deve retirar senhas no local para acompanhar o próximo contingente da visita guiada. A exposição fica no CCCEV até maio deste ano. O horário de visitação é de terça a sexta, das 10h às 19h, e aos sábados, das 11h às 18h. Mais informações no telefone (51) 3226-7974, nos e-mails museu@ceee.com.br e cultural@ceee.com.br no site www.cccev.com.br e no blog http://cccev.blogspot.com.


Quem quiser conferir: www.crea-rs.org.br

Por Vanessa Schneider

Um comentário:

Anônimo disse...

Em face à necessidade de redução no consumo de energia, perdemos o charme da Rua da Praia dos anos 70
Ronaldo Laydner.